“Se o desejo de Deus é que eu aceda à gratuitidade, então
devo exercer essa mesma gratuitidade e interromper a minha corrente de
actividades humanas para poder dar a Deus tempo”. – François Varillon
(1905-78), S.J.
2 – A ORAÇÃO IMPLICA “DESEJO DE DEUS”
“Só o desejo leva Deus a descer. Ele só vem aos que lhE
pedem para vir; aos que pedem com insistência, com ardor, Ele não pode deixar
de descer até eles” – Simone Weil (1909-43). Fillósofa.
3 – ORAÇÕES INTRODUTÓRIAS À “ORAÇÃO”
“Vem Espírito Santo, enche o coração dos teus fiéis e acende
em nós o fogo do Teu amor. Envia, Senhor, O Teu Espírito e renovarás e face da
terra” – Invocação Litúrgica dO Espírito.
“Meu Senhor e Meu Deus, creio firmemente que estás aqui
presente, que me vês, que me ouves, que me amas; adoro-Te com profunda
reverência. Peço-Te perdão dos meus pecados e a graça de fazer com fruto este
tempo de oração. Minha Mãe Imaculada, S.José meu pai e senhor, Anjo da minha
guarda, intercedei por mim”. S. Josemaria Escribá
4 – A ORAÇÃO É UM ACTO DE CONFIANÇA
“Só em Deus descansa a minha alma, só n’Ele está a minha
esperança. Ele é o meu refúgio seguro. Ele é a minha fortaleza : jamais serei
abalado (…). Ponde sempre n’Ele a vossa confiança, abri-lhE o vosso coração :
Ele vos protegerá”. Salmo 62
5 – A ORAÇÃO OBRIGA A “LER E RELER” A SAGRADA ESCRITURA
“Eu quero meditar os Teus mandamentos e prestar atenção aos
Teus caminhos.
Hei-de alegrar-me nas Tuas leis ; não esquecerei as Tuas
palavras…” – Salmo 119,15-16
6 – A ORAÇÃO REQUER “ESTAR-SE PRESENTE EM SI MESMO”
“Quando quiseres orar, entra no teu quarto mais secreto,
fecha a porta e reza em segredo aO Teu Pai que está aí, nesse lugar secreto…” –
Mateus 6, 6.
“Quanto mais ocupados e quantas mais actividades e “coisas
para fazer” tivermos, maior é a sensação estar vivos. Arriscamo-nos porém a
esquecer a arte de nos “ocupar de nós mesmos” e da nossa interioridade
essencial para reconhecer quem somos e porque agimos como agimos. Um pouco de lentidão,
um pouco de tempo gasto apenas a estar sentado no teu quarto sem nada fazer, só
“presente a ti mesmo”, a deixar vir ao de cima as emoções que se sedimentam em
Ti, há-de ajudar-te a dar nomes aos sentimentos que experimentas e a recordar a
tua memória. Isto ajudar-te-à sobretudo a entrares numa purificação e
unificação interiores de que hás-de sair renovado e disponível para as relações
quotidianas. A solidão e o silêncio são um tipo de enraizamento, de
aprofundamento, em que recebes a força para “seres tu mesmo”, para pensares,
para forjares uma palavra que seja tua, e que estará talvez em contraste com
aquela que todos te repetem” – Irmão Enzo Bianchi, Comunidade Bose, Itália.
7 – A ORAÇÃO IMPLICA INTIMIDADE
“À Revelação, confidência de Deus ao homem, o homem terá que
responder fazendo a Deus confidência do seu ser mais profundo. A oração é pois
um coração-a-coração com Deus. Nós falamos-lhE do que é a nossa vida, com os
seus desejos, dificuldades, alegrias e angústias. Não se trata de lhE ensinarmos
nada, mas apenas de se estar presente numa atitude de verdade, numa atitude
filial, ou seja de confidência” – François Varillon (1905-78), S.J.
8 – A ORAÇÃO É “BENÇÃO ” E “LOUVOR”
“Na oração inclino-me mais para o louvor ou para os gemidos
? É importante educar-nos no primado do louvor”. Cardeal Carlo Maria
Martini, Jesuíta.
9 – A ORAÇÃO TAMBÉM É PETIÇÃO INSISTENTE, SEM EXIGÊNCIAS
“A petição insistente de alguma coisa a Deus transforma-nos
pouco a pouco em pessoas capazes de, por vezes, ultrapassar o que lhE pedimos” Julien
Green (1900-98).
10 – A ORAÇÃO REQUER “DOAÇÃO” E “CONVERSÃO”
“Vamos a Maria para entrarmos no movimento do seu coração
que é um perpétuo impulso de abandono e de alegria na presença de Deus”. Padre Christian de Chergé (1937-96). Monge
deTibhirine.
“Em nenhuma outra religião o arrependimento tem o
significado entendido na tradição cristã (…) Ele é fruto dO Espírito Santo e o
traço mais seguro da Sua acção numa alma (…) Não existe outro lugar onde se
possa verdadeiramente encontrar ou conhecer Deus, senão na conversão.
Anteriormente, Deus era apenas uma palavra, um conceito analógico, algum
pressentimento ou vago desejo, um deus de filósofos ou de poetas, mas jamais O
Deus que Se revela num amor sem limites”. Dom André (1929-2010). Monge Cisterciense.
11 – A ORAÇÃO EM STO INÁCIO DE LOYOLA (1491-1556)
“Deus é o motor da minha vida. Ele quer ver-me viver
plenamente sem preferir nada a não ser Ele. Tenho que expulsar de mim tudo
aquilo que não for d’Ele”.
12 – A ORAÇÃO EM S. FRANCISCO DE SALES (1567-1622)
“Deus é o meu guia. Ele é Senhor da minha vida e eu quero
obedecer-lhe como Cristo obedeceu aO Pai”.
13 – A ORAÇÃO DO “ANJO DE PORTUGAL”
“Meu Senhor e Meu Deus, adoro-Vos profundamente e
ofereço-Vos o preciosíssimo Corpo, Sangue, Alma e divindade de Jesus Cristo,
presente em todos os sacrários da terra, em reparação dos ultrajes, sacrilégios
e indiferenças com que Ele mesmo é ofendido…”
14 – ORAR, COM O SENTIMENTO DE SE TER ESQUECIDO O QUE É A
ORAÇÃO
A oração é um caminho verdadeiramente pessoal, com muitas
etapas, que nunca está terminado porque só se concluí no momento da morte.
Convidado a dar testemunho sobre a oração, ao rever os quarenta anos da minha
vida monástica, parece-me que a melhor forma de o fazer seja numa abordagem simbólica
que permita descobrir algo desta apaixonante aventura que é a oração.
É fácil dizer que a minha oração evoluiu à medida que o
rosto de Deus – o rosto do meu Deus – se transformava. Como esquecer, por
exemplo, aquele dia, ou melhor, aquela hora em que subitamente compreendi que
Deus era Pai, que Deus era meu Pai ? Até aí eu orava a Jesus e, mais
precisamente, a Cristo, porque a palavra “Jesus” parecia naquela época
demasiado familiar, demasiado íntima. Ora, no que depois descobri ser a luz dO
Espírito Santo, eis que eu ousava, arrebatado e estupefacto, chamar a Deus:
“Abba ! Pai ! Papá !”. A oração assumia uma forma nova pois brotava do louvor,
da acção de graças, no deslumbramento. Agora tinha finalmente a impressão de
saber orar porque, sempre e de todos os lados, irrompia aos meus lábios essa
palavra bendita : Abba ! Tudo o que aprendera até aí sobre a oração, todos os
livros que lera me apontavam agora esta evidência fulgurante : para orar, é
suficiente situar-me diante de Deus como criança diante de Seu Pai. Esta
atitude surgia-me com toda a simplicidade, ao ponto de me espantar pelo tempo
que demorara a chegar a essa prodigiosa descoberta : Deus ama-te como um pai ! Que
outra coisa seria possível fazer, então, a não ser avançar neste novo caminho
de oração com a confiança de uma criança, de um pequenino, a quem O Espírito
Santo revelara estas coisas “escondidas aos sábios e inteligentes” (Lucas11,
21) ? Chega porém o tempo em que a oração deixa de proporcionar uma felicidade
inefável, e, pelo contrário, se torna um duro labor : “Eu acredito não haver
trabalho mais difícil do que orar a Deus sem desânimo”. Por vezes até é um
trabalho aparentemente impossível de tal maneira esse Pai que esteve tão
próximo parece desaparecer. O caminho da oração transforma-se então num impasse
e somos tentados a abandoná-lo. É a hora da verdade a que ninguém pode escapar
porque é necessário descobrir que a oração, primeiro e antes de tudo, é um dom.
Durante muito tempo posso ter a impressão de ser senhor da minha oração, de
orar como quero, quando quero, o tempo que quero. Mas chega o tempo da aridez,
da secura espiritual a que os antigos monges chamavam “acédia” que até provoca
por vezes desgosto da oração ! É portanto a hora da escolha ! Mas escolher o
quê quando o caminho parece ter-se perdido ? Simplesmente optar por insistir em
avançar na fé, sem verdadeiramente saber onde nos vai conduzir esse caminho que
estranhamente assume a forma de cruz ; avançar orando, apesar do sentimento de
se ter perdido o gosto pela oração !
Continuando nessa via aparentemente sem saída, chega a hora,
“e é agora” dizia Jesus (João 4, 23) em que se abre para nós a cisterna sem
fundo da oração! A Samaritana não teve dúvidas, ao ir carregar água, que o
homem que lhe pediu para beber lhe revela existir no seu coração, faminto de
amor e de ternura, uma fonte sempre viva, ainda que submersa sob as areias do
pecado. É verdade que o coração pode tornar-se num coração de pedra, fechado à
oração. Experiência dolorosa com que nos debatemos mas de que, por vezes, tão
difícil é dar-nos conta. Todavia, não se encontra ela presente no que os
profetas, em particular Jeremias e Ezequiel, tentaram descrever ? : “Arrancarei
do vosso peito o coração de pedra e vos darei um coração de carne” (Ezequiei
36, 26).
O lugar por excelência onde se dá esta operação é o exílio,
que pode tomar múltiplas formas, mas é sempre o cadinho onde Deus realiza a Sua
obra da purificação. Na história do Povo de Deus, o exílio será sempre a
provação suprema necessária para que o Povo descubra O “Deus mais íntimo a nós
mesmos que nós próprios”, de que falará mais tarde Sto Agostinho. Descoberta
fundamental por abrir finalmente o caminho da oração.
É necessário sem dúvida muito tempo – em qualquer caso eu
necessitei anos – para compreender que não temos que forjar a nossa oração, que
não temos que fazer grandes esforços para nos tornarmos um homem ou uma mulher
de oração ; o esforço está na perseverança ! Trata-se de confiar em Jesus,
homem sentado na borda do poço e que nos diz : “Se tu conhecesses o dom de Deus
!” (João 4,10). Se nós soubéssemos que, depois do nosso baptismo a oração já aí
está, no fundo do coração do baptizado, no fundo desse poço sem fundo que é o
coração do baptizado, e que só necessitamos descer em nós para aí descobrirmos,
viva e a jorrar, a oração dO Filho, a oração dos filhos que, também eles, podem
dizer: “Abba ! Pai !” Aliás, chega o tempo em que as próprias palavras já não
têm lugar pois é suficiente permanecer em silêncio, à escuta dO Espírito que
geme em nós, convencidos que os gemidos do mundo (Romanos 8, 22) estão
apreendidos no grito silencioso dO Espírito. Então a oração encontra a sua
plena e misteriosa fecundidade.
J.P. – Tradução livre (com outras fontes) de “Entrer e
demeurer dans la Prière” Hors-série da revista Panorama. Ed. Bayard