Actos 2,1-11 ; Sal 103, 1ab. 29bc-31. 34 ; Gálatas 5,16-25 ;
João 15, 26-27; 16, 12-15
Sopro do Pentecostes
A efusão dO Espírito em Jerusalém pode contemplar-se não
apenas como resposta à oração fervorosa de Maria e dos Apóstolos reunidos no
Cenáculo, mas, igualmente, como realização da promessa de Cristo ressuscitado
no momento em que – ao abençoar os Seus pela última vez – lhes assegurou que em
breve enviaria O Espírito para ficarem revestidos de poder (Lucas 24, 49). Nesta
despedida, Jesus referiu ainda uma condição indispensável para a Missão: terem
sido testemunhas da Ressurreição e acompanhado desde o início o Seu ministério.
“Vós que estais coMigo desde o princípio, dareis testemunho de Mim”.
Pedro não esqueceu estas palavras pois bem sabemos como,
após a Ascensão, quando foi nessessário reconstruir o grupo dos Doze e
substituir Judas (Actos 1, 21-23), não mandou fazer nenhuma lista com as
qualidades do candidato ideal porque havia essa condição prévia: ter
acompanhado Jesus desde o baptismo até à Ascensão. Diante de um mundo hostil ao
Evangelho, os Apóstolos hão-de sentir-se sem recursos mas nunca ficarão sós; O
Espírito Santo será a partir de agora o seu tutor, o seu Defensor. Jesus
chama-O de “Paráclito”, ou seja alguém que virá para junto deles e
permanentemente os acompanhará : “Eu vou pedir aO Pai e Ele vos dará outro
Paráclito para que esteja sempre convosco; Espírito de verdade que o mundo é
incapaz de acolher pois não O vê nem O conhece ; vós é que O conheceis porque
habita convosco e está em vós” (João
14,16-17).
“Meu Deus, eterno
Paráclito, eu Te adoro, Tu que és a Luz da minha alma”. Cardeal Newman
(1801-90).“Vem, Luz verdadeira, vem tesouro sem nome…Vem, Tu que Te
tornaste desejo em Mim”. Simão, o novo teólogo (949 -1022).
Existem vários elementos identificadores que nos dizem
estarmos na presença de uma manifestação divina, de uma teofania, quando Deus
Se revela e dá : som forte, vento ou brisa ligeira, fogo (por ex : Êxodo 19,
26). Foi igualmente assim que os Apóstolos “ficaram cheios dO Espírito Santo”
que os transformou profundamente e fez capazes de anunciarem a Boa-Nova.
Os Actos dos Apóstolos insistem particularmente na
capacidade de falarem outras línguas e de se fazerem entender pelos
estrangeiros. Circunstâncias que nos recordam acontecimentos bíblicos como o da
construção da Torre de Babel e a confusão das línguas que aí se gerou,
relatadas no cap.11,1-11 do Livro do Génesis. Segundo a tradição judaica a
Torre de Babel era uma empresa totalitária que pretendia subjugar tudo e todos,
afrontando o próprio Deus, com uma ideologia caracterizada pela vontade de
poder absoluto. A Torre de Babel ajuda-nos a compreender melhor o cap.2 dos
Actos dos Apóstolos da liturgia de hoje, cuja perspectiva é radicalmente
diferente: convite da Igreja para que não nos deixemos fascinar por semelhantes
“unidades”enganosas. O problema, de facto, não está em ter que se falar a mesma
língua – de “estar no mesmo barco”, como escreveu o filósofo André Néher
(1914-88) – mas antes, em nos encontrarmos com o outro nas suas diferenças. Para
isso devemos aceitar que Deus habite o nosso coração, ultrapassando a tentação
– particularmente forte em tempos de crise – de nos fecharmos no “clã” a que
pertencemos.
Então, anunciaremos as maravilhas de Deus.